8 de abril de 2013

Opinião - Secretário Executivo da CNTE, Professor Odair Neves, opina hoje sobre 'Educação, Constituição e Cidadania'












Professor Odair Neves, Diretor do SINPROESEMMA e da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação(CNTE), Membro do Conselho Estadual de Educação do Maranhão e graduando em Direito pelo CEUMA.  




'Educação, Constituição e Cidadania'


Objetivos da educação

O ser humano aprende desde o nascimento, o primeiro contato com os médicos, enfermeiros e demais auxiliares já é objetivamente um primeiro contato com culturas diferentes, linguagem, saberes. Essa interação vai se repetir por toda vida, de modo que as primeiras palavras, os primeiros passos e gestos, bem como a preferência mais tarde por determinada ciência ou esporte são o resultado natural desse aprendizado.

Vemos então que o aprendizado se dá no contato e interação com o mundo, razão por que, inicialmente, é da família a tarefa de ensinar as primeiras regras, valores e costumes.

Com o passar do tempo, essa educação familiar não é mais suficiente, o desenvolvimento do indivíduo exige um processo mais complexo de ensino, na medida em que os temas se tornam mais variados e profundos. É preciso então aperfeiçoar o processo de modo a dar conta da complexidade dessa nova fase e também de redirecionar o aprendizado.

É na educação escolar que reside a tarefa de dar direção a esse aprendizado. Também é preciso ter claro que não é correto pensar a educação fora de um contexto social, político e cultural. Daí resulta que a direção dada ao aprendizado numa sociedade sempre depende do projeto de sociedade a ser “implantado”, o conhecimento sempre assumindo uma função social determinada.

Por outro lado não se pode falar em educação como algo estático, mas como um processo que está sempre em construção, portanto, é certo que a sociedade também está a serviço da educação.

O Brasil, há tempos escolheu uma direção a ser dada pela educação ao aprendizado. A Constituição de 1988(cidadã) estabelece em seu artigo 205 que a educação será promovida visando “o pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”, essa diretiva se repete em todos os documentos produzidos depois da Constituição, da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional às Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica. Nesse sentido, vejamos o que diz a Lei de Diretrizes e Bases:

“Art. 2º A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.


Art. 22. A educação básica tem por finalidades desenvolver o educando, assegurar-lhe a formação comum indispensável para o exercício da cidadania e fornecer-lhe meios para progredir no trabalho e em estudos posteriores”.

No mesmo sentido, dispõe a Resolução que define as Diretrizes Curriculares:

“Art. 1º A presente Resolução define Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para o conjunto orgânico, sequencial e articulado das etapas e modalidades da Educação Básica, baseando-se no direito de toda pessoa ao seu pleno desenvolvimento, à preparação para o exercício da cidadania e à qualificação para o trabalho.
...

Art. 5º A Educação Básica é direito universal e alicerce indispensável para o exercício da cidadania em plenitude, da qual depende a possibilidade de conquistar todos os demais direitos, definidos na Constituição Federal, no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), na legislação ordinária e nas demais disposições que consagram as prerrogativas do cidadão”.

Mas a questão é: estamos cumprindo esse mandamento? Quanto à formação para o trabalho, mereceria uma boa análise do ensino profissionalizante ministrado no País, e até mesmo do regular, para responder adequadamente essa questão, algo que não é nosso objetivo neste momento. Mas, apenas como sinalizador do que tem sido feito nesse campo, basta apenas lembrarmos que no Maranhão, por exemplo, há algum tempo foi completamente desmontada a Rede Pública de educação profissional e somente há bem pouco tempo vem sendo reconstituída parte dessa Rede.

Quanto à formação para a cidadania, a situação parece também não ser das melhores.

Educação e o preparo para o exercício da cidadania

Ser cidadão é estar no pleno gozo dos mais diversos direitos civis, políticos e sociais de um Estado. Cidadania é a condição de ser cidadão. Preparar para o exercício da cidadania seria então preparar para o exercício dos direitos civis, políticos e sociais: vida, liberdade, propriedade, igualdade perante a lei, votar, ser votado, educação, trabalho justo, saúde, velhice tranquila, etc.

Portanto, para sabermos se estamos preparados para o exercício da cidadania, basta respondermos adequadamente a algumas perguntas que se impõem: as pessoas conhecem os seus direitos? As pessoas sabem defender seus direitos? As pessoas sabem que a igualdade perante a lei implica o respeito e garantia do direito do outro?

Basta uma simples verificação das respostas a essas perguntas e constataremos que não estamos preparando nossa população para o exercício da cidadania. Será que é difícil imaginar a quantidade de pessoas que não sabem que todos têm direito à moradia, à saúde, ao trabalho digno, que a regra é a liberdade e que a prisão só deve acontecer em situação extrema? Não é difícil encontrarmos pessoas que consideram um absurdo o Estado fazer o mísero esforço para garantir ao “cidadão” uma refeição diária, ou educação para todas as crianças, e também encontramos pessoas que acham normal o Estado dispor de bolsa para o estudo na pós-graduação e não aceitam a bolsa para garantir a criança na educação infantil.

Numa breve retrospectiva, não é difícil constatar que a preocupação com a educação para a cidadania no Brasil já vem de longe, desde o Império, expressa nas Constituições da época.

Por outro lado, essa preocupação nunca se transformou em ações práticas. No império, o que se verificava era uma sociedade excludente, escravocrata, onde só tinham direitos os livres e proprietários.

Não obstante o que se verificava nas Constituições, a educação se destinava a poucos e apesar da crença de que o desenvolvimento do País passava pela escolarização de muitos e consequente formação de mais cidadãos, pouco se verificou de mudança concreta.

Essa é uma realidade que, grosso modo, se mantém até os tempos atuais. Com uma ou outra iniciativa pontual e com pouco resultado prático em época mais remota, faz pouco tempo são tomadas medidas mais concretas no sentido de promover uma verdadeira educação para a cidadania. O marco inicial desse novo tempo é a Constituição de 1988, dita cidadã, depois veio a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, em 1996, o Plano Nacional de Educação em Direitos Humanos, em 2003, e as Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica, em 2010.

Mas o que se percebe quando vemos as respostas àquelas perguntas é que falta muito. São poucas as medidas mais concretas. As resistências ainda são enormes, fruto de uma educação historicamente elitista, para poucos, que sempre promoveu uma sociedade onde poucos têm direito a ter direitos.

Cidadania e o conhecimento da Constituição de 1988

A Constituição Brasileira, como a Constituição de cada Estado, é nossa lei fundamental, é um sistema de normas jurídicas que estabelece a estrutura do Estado, nossa forma de governo, nossa forma de aquisição e exercício do poder, a organização dos órgãos e os limites de ação do Estado, os direitos fundamentais dos indivíduos e suas respectivas garantias, fixa o regime político e disciplina os direitos econômicos, sociais e culturais de todos.

Do que já vimos, podemos dizer que exercer a cidadania é estar no pleno gozo dos direitos civis, políticos e sociais a disposição, direitos estes estampados na Constituição. Mas, por óbvio, ninguém requer ou desfruta de algo que não conhece. Logo, não podemos chegar à outra conclusão senão a de que é condição, não suficiente, mas necessária, o conhecimento da Constituição para o exercício pleno da cidadania.

Formar cidadãos é ensinar o conteúdo da Constituição

Como vimos, não é possível o exercício da cidadania sem o conhecimento da Constituição, visto que os direitos civis, políticos e sociais estão normatizados nela. Portanto, por um simples raciocínio lógico, chegamos a inafastável conclusão de que aquela diretriz fixada na própria Constituição e também presente na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Básica, de que a educação deve formar para o exercício da cidadania, implica, necessariamente, fazer com que todos conheçam o conteúdo da Constituição.

O próprio legislador constituinte apontou nesse sentido quando dispôs no artigo 64 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias que “A Imprensa Nacional e demais gráficas da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, da Administração direta ou indireta, inclusive fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, promoverão edição popular do texto integral da Constituição, que será posta à disposição das escolas e dos cartórios, dos sindicatos, dos quartéis, das igrejas e de outras instituições representativas da comunidade, gratuitamente, de modo que cada cidadão brasileiro possa receber do Estado um exemplar da Constituição do Brasil”.

Preparar o brasileiro para o exercício da cidadania é um dos objetivos da educação do País, consolidado em nossa Constituição de 1988 e em diversas normas infraconstitucionais.

Seguindo uma tradição há anos observada entre nós, o preparo para o exercício da cidadania, apesar de estar presente no nosso ordenamento jurídico como uma função prioritária do Estado Brasileiro, a ser exercida através da educação, na prática hoje também não se efetiva.

A efetivação dessa função do atual Estado Brasileiro, passa pela execução de medidas concretas. As primeiras são aquelas elencadas no artigo 65 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, que determinam a distribuição em massa da Constituição, como forma de disseminar o conhecimento nela guardado. Mas estas medidas não são suficientes, pois de nada adianta a entrega de um exemplar da Constituição sem a devida explicação do seu conteúdo, ainda mais num País como o nosso que, infelizmente, ostenta um alto índice de analfabetismo funcional, é como entregar uma caixa de conhecimento que não tem como ser aberta.

Quando o Constituinte Originário tratou de fazer chegar a cada brasileiro um exemplar da Constituição, qual seria sua verdadeira intenção? Não restam dúvidas de que seria fazer com que cada brasileiro se apossasse do conteúdo da Constituição, é claro que acabou dizendo menos do que queria.

Como resolver então o problema? Não adianta querer “inventar a roda”, o caminho é fazer a educação cumprir o seu papel. É fazer nosso sistema educacional ensinar o conteúdo da Constituição. Essa deve ser a ordem do dia



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